Luan dos Santos, 13 anos, era o que alguns professores chamam de “aluno problema”. Além de não estudar, juntava-se a outros que “não tinham jeito” para perturbar na sala de aula. Há três anos descobriu o xadrez na Escola Estadual Helena Pugó, localizada no Bongi, Zona Oeste do Recife. O jogo não mudou apenas a opinião do corpo docente sobre o aluno. O próprio garoto diz que, hoje, é outra pessoa. “Aprendi a refletir antes de agir e não saio mais brigando por qualquer besteira. Posso até dizer que agora sou calmo”, garante. A história de Luan não é um caso isolado. Muitos alunos também chegaram na sala da professora Elizabeth Souza desacreditados.

“Tive uma aluna que, depois de vencer uma partida gritou: ‘eu consigo pensar!'”, lembra a professora que ensina o jogo há mais de dez anos. Elizabeth, uma entusiasta que chega a tirar dinheiro do próprio bolso para que seus alunos participem de torneios, explica que o xadrez na escola não é apenas um jogo, mas uma importante ferramenta pedagógica. “No xadrez, há uma guerra entre dois reinados e o objetivo é o xeque-mate no rei. Trazemos isso para a vida dos meninos, que precisam dar o xeque-mate na violência, nas drogas e numa série de outras dificuldades”, compara.

Inspirado na ideologia do jogo, um aluno de apenas 14 anos propôs à professora encenar uma peça de teatro intitulada “Xadrez na escola, xeque-mate na violência”, com o objetivo de levar outros alunos à sala de xadrez da Helena Pugó. Um grupo de estudantes foi responsável pelo roteiro e ensaios. O resultado? Apresentaram a peça no I Torneio de Xadrez Governador Miguel Arraes, realizado no mês passado, e foram convidados para compartilhar a experiência com alunos de outras escolas públicas e particulares também.

Quando saiu da escola, Armênio Martins, 29, levou o que aprendeu para as ruas de San Martin, próximo à Helena Pugó, montando o primeiro clube de xadrez do bairro. “Queria fazer o que a professora faz: educar pessoas transformando-os em cidadãos”, diz o jovem que, quando começou a aprender o esporte, chegou a copiar um livro inteiro. Como Luan, Armênio era mais um desses alunos tachado como problema pelas escolas públicas. Seu exemplo é uma prova para Luan e os cerca de 300 estudantes que freqüentam a sala de xadrez da educadora Elizabeth de como uma guerra para conquistar reinados pode influenciar a vida. “Até na hora de conseguir emprego o xadrez me ajudou. Quando coloquei no currículo que jogava, as portas se abriram”, diz o rapaz que trabalha num hospital particular do Recife.

No mesmo caminho está Oldemar Ferraz, 17, aluno da Escola Jordão Emerenciano, no Ibura, Zona Sul do Recife. O contato com o jogo aconteceu quando tinha 7 anos, mas foi na unidade de ensino que aprendeu de fato as regras do jogo. “Levamos o que aprendemos aqui para a vida. No jogo, idealizamos todo o tempo o xeque-mate e, na vida, idealizamos nossos objetivos”, explica. Oldemar não planeja a longo prazo. A cada ano, lista os objetivos a serem alcançados. “Nos tornamos mais disciplinados e aprendemos a focar melhor”, ensina.

Há quatro anos a Escola Jordão Emerenciano oferece o xadrez a seus alunos. Nas unidades públicas, o jogo não é uma disciplina obrigatória, mas optativa. Às segundas, quartas e sextas-feiras, a professora Lígia Ferreira utiliza o horário livre dos estudantes. “Quando o professor falta, os alunos vêm pra cá jogar”, afirma Lígia. Cerca de cem estudantes da Jordão Emerenciano revezam os tabuleiros. A adolescente Juliana Maria da Silva, 17, é uma delas. Cursando a 6ª série no programa de aceleração, a menina diz que o jogo está ajudando. “Melhorei muito, principalmente em matemática”, revela. A professora Lígia confirma a melhora do rendimento dos alunos. “No conselho de classe do ano passado, 70% dos alunos que freqüentam a sala de xadrez tiveram boas notas.”

XADREZ NAS ESCOLAS – O ex-governador Miguel Arraes inseriu a prática de xadrez nas escolas estaduais na década de 80. O diretor da Biblioteca Estadual de Xadrez Cristiano Lira, Marco Asfora, ressalta a importância do programa. “Desenvolve a inteligência, memória e sociabilização dos alunos, além de afastá-los da ociosidade e estimular o poder de decisão e concentração”. Segundo Marco, a biblioteca, que funciona no Centro Esportivo Alberto Santos Dumont, em Boa Viagem, oferece um acervo de três mil livros e é aberta ao público.

O programa Xadrez na Escola foi ampliado em 2005, beneficiando cinco municípios do interior do Estado: Limoeiro, São José da Coroa Grande, Tamandaré, Barreiros e Petrolina. A iniciativa é uma parceria da Secretaria de Educação com o Ministério dos Esportes e tem como objetivo garantir aos estudantes a inclusão social com o acesso ao esporte, além de desenvolver conceitos e habilidades de liderança, trabalho em equipe e disciplina. Foram distribuídos kits, incluindo mural, tabuleiros e peças.

SERVIÇO

Gostou das iniciativas relatadas acima? Você também pode ajudar a ampliar este projeto.

Escola Helena Pugó Professora Elizabeth Souza
Endereço: Rua 15 de março, s/n, Bongi. Recife – PE
Tel.: (81) 9252.2953

Escola Jordão Emerenciano Professora Lígia Ferreira
Avenida Angra dos Reis, s/n, Ibura. Recife – PE
Tel.: 34756172

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Fonte: JC Online.