Número varia de acordo com instituição, mas pode levar a uma carência de professores na rede pública de ensino

Se o acesso às universidades públicas brasileiras é considerado difícil por muitos estudantes, depois que conseguem uma vaga, outros mais enfrentam problemas para concluir os cursos que escolheram.

 

A situação parece ser mais grave em carreiras como Matemática, Física e Química, nas quais, dependendo da instituição de ensino, o percentual de alunos que deixam de se formar chega a 85%. O cenário pode levar a uma carência de professores dessas disciplinas na rede estadual de ensino.

No Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), apenas 15% dos alunos que ingressam nestes três cursos se formam. Segundo a chefe do departamento de Ensino Médio e Licenciatura da instituição, Luiza Santos Pontello, semestralmente, são ofertadas 35 vagas, em média, em cada uma destas áreas, mas apenas cinco estudantes, por turma, concluem a graduação.

Para ela, uma das causas da evasão está no fato de que a formação em cursos de licenciatura exige muito dos alunos e falta valorização profissional no mercado de trabalho. “Há uma boa procura pelos cursos, no entanto, muitos, desistem”, diz. Luiza acrescenta que falta investimento na estrutura das escolas, salários dignos e tempo para que os professores possam se especializar. “A baixa formação nos cursos de licenciatura já é uma questão cultural. Enquanto não houver valorização desse profissional, vai ser difícil mudar esse quadro”, avalia.

Na Universidade Estadual do Ceará (UECE), não é diferente. Conforme a professora e assessora da Pró-Reitoria de Graduação, Mônica Façanha, no curso de Matemática, a cada semestre, ingressam 80 alunos. Na última turma, contudo, formaram-se apenas 24, ou seja 30%. No curso de Física, continua Mônica, ingressam 60 estudantes por semestre, mas se formaram apenas 20 na última turma, o que corresponde a 33% do total. Em Química, dos 60 que entraram apenas 18 – 30% da turma inicial – concluíram o curso.

A coordenadora de Formação Pedagógica das Licenciaturas da Universidade Federal do Ceará (UFC), Carmensita Passos, os próprios professores das universidades dão prioridade ao bacharelado e não às licenciaturas. Segundo ela, a maior parte dos docentes não é licenciada e, por isso, incentivam que os alunos sigam a linha da pesquisa e não da docência.

Carmensita declara que não há um incentivo salarial no mercado e nem condições de trabalho nas escolas. Ela acrescenta ser importante, além da demanda social e incentivo por parte dos professores, que haja uma maior oferta de bolsas de iniciação à docência e políticas públicas educacionais que possam reverter a situação.

A estudante Camila Maroco de Sousa ingressou no curso de Matemática da UFC em 2006, mas, após um ano, desistiu da licenciatura e, hoje, estuda Engenharia Civil na Universidade de Fortaleza (Unifor). Segundo ela, as péssimas condições do curso, a falta de assiduidade dos professores e a ausência de uma grade curricular voltada para o ensino foram os principais motivos da desistência.

A estudante ressalta que falta didática ao curso. “A gente aprendia coisas que jamais poderia repassar para os alunos do Ensino Básico. Além disso, não tinha a mínima noção de como iria ensinar. Parece até que eles pegaram o currículo do bacharelado e adaptaram para a licenciatura”, ressalta.

EVASÃO

Despreparo vem da formação básica

A assessora da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Estadual do Ceará (Uece), professora Mônica Façanha, acredita que os altos índices de evasão dos nos cursos de licenciatura em Matemática, Física e Química têm relação com falhas na formação dos alunos desde o ensino básico. Segundo ela, a maioria deles é proveniente de camadas sociais menos favorecidas e, consequentemente, estudou em instituições da rede pública de ensino.

Conforme Mônica, o despreparo acaba levando à evasão nas universidades, já que esses cursos de licenciatura exigem muito intelectualmente dos estudantes. “Eles apresentam dificuldade em enfrentar o próprio curso. Essa situação cria uma lacuna no ensino Médio e interfere no aprendizado na universidade, formando, assim, um círculo vicioso”, avalia.

Outra situação que se configura neste cenário, de acordo com a assessora, é que, diante da carência de professores no mercado, há uma grande oferta de vagas nas escolas. Assim, em muitos casos, os estudantes dividem o tempo de estudo na universidade com dois turnos de trabalho em sala de aula.

O recomendado, ressalta Mônica, é que esses estudantes apenas façam estágios nas instituições e não exerçam a tarefa de professor titular. “Se já é difícil acompanhar sendo estudante exclusivo, quanto mais trabalhando o dia inteiro”, explica.

Apesar de todos esses desafios, Mônica diz que o Ministério da Educação (MEC) vem desenvolvendo projetos para modificar esta triste realidade. Ela lembra que, em 2008, o órgão lançou o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), que oferece bolsas aos alunos de cursos presenciais que se dediquem ao estágio nas escolas públicas e que, quando graduados, se comprometam com o exercício do magistério na rede pública.

KARLA CAMILA
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste 15/07/2010.